O encontro Janio-Juscelino (11 de abril de 1956)

Sábado último, em Assis, por ocasião do encerramento do Congresso Rural levado a efeito naquela cidade da Sorocabana, deu-se o esperado encontro do Governador do Estado com o Presidente da República.

Observadores políticos aguardavam com ansiedade e indisfarçável expectativa, o encontro dos dois Chefes de Estado, principalmente quando nos últimos tempos, a amizade política dos dois poderes andava lá algo estremecida.

O aeroporto de Assis, superlotado por autoridades, polícias, curiosos, lavradores e representantes da imprensa, apresentava um aspecto incomum, desusado. Milhares e milhares de pessoas tinha acorrido àquela cidade, a fim de participar ou assistir ao conclave, que em verdade monopolizou as atenções de todo o Brasil.

Com a pontualidade britânica, chegou o Governador a Assis, viajando em avião de carreira da VASP. O Presidente da República, viajando em avião especial da FAB, chegou com um considerável atraso. A expectativa era maior em torno do encontro Jânio-Juscelino, do que propriamente pela chegada do Presidente da República. O abraço dos dois Chefes de Estado, fez espocar centenas de “flashes” fotográficos, quando repórteres de vários órgãos da imprensa “furaram” o cerco de políticos, policiais e “tiras”, para nos perder o sensacional flagrante.

Sorridente, o sr. Juscelino Kubitschek, mostrava-se acessível e satisfeito. Por seu lado, o sr. Jânio Quadros, demonstrava não estar possuído de igual satisfação. Parecia que idêntica satisfação não existia por parte dos dois líderes governamentais. O Governador do Estado, menos palrador, distanciava-se quase sempre do Presidente Juscelino. O povo presente, no entanto, queria ver os dois juntos, seguidamente. Registrou-se até um fato curioso, quando a “verve” popular se fez sentir, ocasião em que algumas pessoas pediam: “Queremos os dois juntos... “café com leite”!

Por ocasião do encerramento do conclave, que ocorreu no Estádio da Ferroviária de Esportes, quando todos os presentes esperavam a decretação do preço mínimo do algodão em caroço, tal não sucedeu. Após a palavra oficial da entidade rural e também após o discurso do sr. Tiago Ribeiro, prefeito de Assis, usou da palavra o Governador do Estado. Psicólogo como é, o sr. Jânio Quadros historiou bem a situação aflitiva dos plantadores da alvácea, tendo reconhecido a justeza da luta do conclave e seus legítimos direitos, terminando por “passar a bola” para o Chefe da Republica, por ser a questão de alçada do poder federal.

Quando o sr. Juscelino Kubitschek acercou-se do microfone, uma expectativa pesada dominou o ambiente. Num improviso brilhante, pois o Presidente da Republica é na verdade um grande dotilóquio, o sr. Kubitschek procedeu a uma análise completa da situação inflacionária do Brasil, historiou em resumo seus trabalhos à frente do Executivo nacional, abordou a questão do salário mínimo (que deverá ser decretado em princípios de agosto), falou sôbre o funcionalismo público federal e a compressão de despesas, terminando por tecer um grande louvor ao govêrno do sr. Jânio Quadros, afirmando que pretende no âmbito federal, realizar “um govêrno honesto e austero, à base de compressão de despesa, como o do honrado Governador de São Paulo”! Tal afirmativa do Presidente da Republica, arrancou aplausos sem conta dos presentes e fez sorrir (uma das poucas vezes), o sr. Jânio Quadros.

No final, o Presidente da República não chegou a decretar o preço mínimo do algodão, conforme se esperava e que representava mesmo o ponto básico e primordial do Congresso. Fazendo uma análise das necessidades de estudos e cálculos acurados, o Chefe do Govêrno terminou por convidar uma comissão especial, para entender-se com o mesmo, no Palácio do Catete, a fim de resolver em definitivo a tormentosa e difícil questão.

O efeito das palavras do Presidente da Republica, teve uma espécie de retardamento em sua interpretação. Só alguns momentos depois da oração do sr. Juscelino, é que principiou a manifestar-se o descontentamento por parte de uma grande maioria ali presente.

Ao nosso lado, um cidadão de botas e chapéu de “cowboy”, resmungava: “Ué, mais o hóme falou tanto e não disse nada sôbre o preço do argodão?”...

Extraído do Correio de Marília de 11 de abril de 1956

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