Questão da emotividade (05 de outubro de 1974)
Não sei explicar bem.
Ou os sofrimentos da vida,
indelevelmente entalhados no próprio Ego. Ou o amadurecimento mental completo.
Ou o avançar dos anos.
O exato é que, ao contrário
do que possa parecer, tem gente que caminha a passos largos, para a
sensibilidade emotiva.
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Tenho visto e sentido isso, à
miude.
Pessoas aparentemente
“duronas”, chegando a um percurso da vida, em que a sensibilidade delas se
aproxima, parecendo tornar mais terno o coração.
Conheço muitos casos assim.
Aqui em Marília.
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Inda outra noite, batendo uma
caixa com o assessor de imprensa da Câmara, o popularíssimo Toninho Neto,
inesperadamente e sem colimar, eu mesmo cheguei a dar uma prova desse fenômeno.
No decurso da palestra, onde
abordamos um rosário de assuntos marilienses, surgiu à tona algo relacionado
com a Apae.
E o Toninho perguntando-me se
eu já havia visitado a referida instituição, obteve de minha parte resposta
negativa. Aconselhou-me ele que eu deveria fazer uma visita a Apae, para melhor
aquilatar o grau de altruismo e de solidariedade humana da referida obra de
benemerência.
Fui incisivo e categórico na
minha resposta:
Não havia ido e nem tinha
intenções de ir lá, porque iria sair triste e preocupado com a sorte daquelas
crianças excepcionais. E preferia “sabê-las” assim, sem vê-las.
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Toninho compreendeu e
concordou, confessando também que ele não gostava de visitar aquele centro
exatamente porque se sensibilizava demasiadamente com os quadros vivos ali
presenciados.
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É claro que nem todos pensam
assim e nem assim devem agir. Mas é claro também que seja fácil assimilar os
pensamentos e atitudes das pessoas que assim se portam.
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Ontem, uma palestra casua,
com um cidadão mariliense, voltou a acionar minha sensibilidade e emotividade
de “velho”.
Conversava com esse amigo,
mariliense de mais de trinta anos. Conversa trivial, espontânea, que se varia
naturalmente, fazendo com que os assuntos saltem mais do que pipoca na panela.
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E o amigo dizia-me haver
levantado naquela manhã num estado nervoso e melancolicamente triste ao mesmo
tempo.
Que, inclusive, havia
exasperado-se e alterado a voz com um cidadão, chegando a dizer um palavrão ao
outro.
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Atribuiu o gesto, ou ao
estado de estafa, ou à preocupações financeiras, ou mesmo a um mau
funcionamento do fígado.
E prosseguindo na dissertação
do mesmo assunto, fez sem o pretender a confissão que ressonou em meu estado de
emotividade.
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Disse-me ele:
- Vou fazer o que faço sempre
em situacões assim, quando me encontro triste, nervoso ou em estado de depressão:
vou dar um pulinho à cidade tal (fora de Marília) e visitar minha velha mãe.
Todas as vezes que fico nervoso, triste, aborrecido e melancólico, vou abraçar
minha mãe e bater uma caixa com a “velha”. Passa tudo, mesmo que eu nada lhe
conte. Retorno aliviado, feliz, “zero quilômetro”.
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Tentei não demonstrá-lo, mas
fiquei muito emocionado que aquele apego ao amor da mãe e os efeitos que esse
amigo confessou sentir com isso.
Não disse nada a respeito,
porque pude assimilar a majestosidade desse sentimento filial, quiçá melhor do
que ele próprio.
Mas é difícil explicar o
porque. Talvez porque eu tenha perdido minha mãe muito cedo, ainda muito
criança, quando mais eu necessitava de seu calor, de seu carinho…
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