Expedientes políticos (22 de outubro de 1974)
Em 1948, determinado deputado paulista fez-me presente de
um cartão impresso, constando meu nome e função profissional. O referido
documento dava-me o direito de “ingresso livre” no recinto da Assembleia
Legislativa do Estado.
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Certa feita, indo à Capital e
dispondo de tempo, pretendi conhecer o Palácio 9 de Julho e presenciar uma
sessão ordinária da Assembleia Legislativa.
Lembrei-me do “ingresso
livre” e isso mais animou-me a conhecer o parlamento.
Na entrada, exibi o cartão ao
guarda civil que estava na porta e o policial nem siquer deu-se ao trabalho de
examinar ou pelo menos atentar para o nome do portador. Mandou-me simplesmente
adentrar.
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Já instalado nas galerias do
plenário, estabeleci palestra com um cidadão e comentei o fato do documento.
Disse-me o homem:
- Isso não vale nada, é uma
demagogia muito barata. Esta é a parte destinada ao público e aqui toda pessoa
entra e sai livremente, sem necessidade desse cartão. Mesmo que você necessita
falar pessoalmente com um deputado, isso nada representa, porque quem atende
primeiro é a secretária particular de cada um deles.
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Percebi e mais tarde
constatei que essa formalidade não tem valor, pois, como cidadão comum,
qualquer pessoa entra sem esse cartãozinho, na Assembleia, na parte destinada a
assistência.
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Nestes últimos tempos,
especialmente nesta era de campanha eleitoral, tendo recebido dezenas desses
“ingressos livres”, remetidos por deputados candidatos à reeleição.
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O que a respeito causou-me
espécie é o recebimento periódico desses “ingressos”, inclusive alguns com
propaganda política no verso. Suponho que essas impressões tenham sido feitas
aos milheiros e, nesse caso, está havendo milhares e milhares de pessoas
“credenciadas” com o “livre ingresso” na Assembleia Legislativa.
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Os candidatos apegam-se a
tudo e a todos, utilizando até armas escusas e processos idem.
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Quando da primeira eleição
dos deputados estaduais para a Assembleia Constituinte de 1947, fui apresentado
a determinado cidadão, que era candidato a deputação estadual.
A pedido deste e por
solicitação simultânea de um mariliense, escrevi alguns motivos para discursos
políticos do mesmo, com bases em dados me fornecidos. Minha participação foi
somente a de redator e fi-la sem interesse qualquer.
Tanto isso é verdade que o
aludido cidadão, após ter vencido o pleito e sagrando-se deputado, escreveu-me
uma carta de agradecimento e pediu que lhe enviasse duas fotos minhas do
tamanho 3 x 4.
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Se, saber a razão do pedido e
sem alternativa, atendi o solicitado e enviei as fotografias.
Cerca de um mês após recebi
pelo correio um envelope timbrado da Assembleia e um ofício do deputado,
oferecendo-me uma carteira que me concedia “passe-livre” na Companhia Paulista
de Estradas de Ferro.
O que me surpreendeu foi que
nessa cédula, com meu nome, fotografia e endereço, constava ser eu suplente de
deputado em exercício!
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Fiquei chocado e entendi que
jamais poderia aceitar aquela imoralidade.
Arranquei a foto da cédula e
a devolvi ao deputado, com uma carta em que condensei a recusa e a censura ao
método utilizado. Nunca mais o referido deputado lembrou de mim…
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