Da poesia ao poema (10 de outubro de 1974)
Recordo-me muito bem.
Foi no ano de 1939, portanto
há 35 anos passados, que consegui publicar meus primeiros rabiscos em jornais.
Era estudante, trabalhava em
escritório e o que percebia, como fruto do trabalho, tornava-se insuficiente
para viver. Porisso, exercia nas horas vagas e após o período das aulas
noturnas, o “bico” de garçon.
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Sentia, mesmo criança, muito
fascínio pela imprensa. Gostava de ler o jornal bi-semanário da cidade, com
muita atração e avidez. Sentia muita admiração por um caboclinho, chamado Eloy,
que era o redator do aludido hebdomadário.
Sentia, igualmente, desejos
de escrever e ver meus escritos publicados no jornal “O Progresso”, que existia
naquele tempo, na vizinha cidade de Lins.
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Um dia criei coragem e fui
procurar o jornalista.
Pedi-lhe que me desse uma
oportunidade, que aceitasse minha colaboração, pois gostaria de ver algo de
minha lavra, ser publicado num jornal. “Seo” Eloy mediu-me dos pés a cabeça e
sentí que não o havia impressionado nem um tiquinho. Ele tinha razão, pois eu
era um garoto raquítico, de sapatos muito gastos e de roupas bem pobres e
modestas.
Mesmo assim, disse-me que eu
poderia deixar alí o “material” e que o procurasse outro dia, pois “iria ver,
quando tivesse tempo”.
Deixei a redação encabulado,
desenxabido e desesperançado.
Receioso, alguns dias após,
voltei a falar com o profissional.
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Não sei se o “Seo” Eloy havia
compadecido-se de minha pessoa simples e humilde, ou se havia achado os
escritos algo razoáveis. Disse-me:
- Menino, você vai ter que
gastar muito lápis, para aprender a escrever. É preciso muito tempo para ficar
“de vez” e e muito mais tempo ainda para ficar “maduro”. Vou ver o que posso
fazer com seus artigos, mas ouça aqui um conselho: não dedique e nem perca
tempo com poesias; procure coisas e motivos objetivos. Poesia é coisa de quem
tem tempo e vive fora da realidade das preocupações do trabalho. E mais ainda,
procure estudar melhor seu português.
Despedi-me sem jeito, com a
decepção reavivada.
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No domingo seguinte exultei
de alegria ao ver publicada, em página inteira, uma pequena croniqueta que
havia feito. As poesias não foram divulgadas.
Dali em diante passei a
sentir a sensação alegre de mostrar aos meus amigos e colegas de escola, alguns
de meus trabalhos publicados.
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Essa lembrança ocorreu-me um
dia destes, quando minha esposa exibiu-me um rascunho de um escrito, trabalho
que eu nem siquer lembrava mais. Que pretendi publicar no “Correio” e que por
uma razão qualquer não fiz.
Reli o trabalho, em forma de
rascunho e lembrei-me então que deveria fazer uns quinze anos que o escrevi.
O título: “Poema à Marília”.
Para curiosidade, divulgo
agora esse “Poema à Marília”, escrito talvez há uns quinze anos e que se
encontrava perdido entre papéis velhos e documentos.
Vejamo-lo:
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Do nada vieste e com tudo nasceste.
Tens tudo o que é belo, tudo
que é querido.
Tens o sol, as estrelas, o
vento e o luar.
As chuvas e os rios que
correm prô mar.
A luz e o carinho, a vida e o
progresso.
A vida em sí, a natureza em
flor,
O calor da existência,
Tens a seiva do amor.
Do verde emergiste. Verde das
matas.
Matas brasileiras que
ornamentam regatas.
Como és querida, Marília
linda!
Não te atingem os
conculcadores
Falam de tí, de teus amores
Malinidades que não te
alcançam.
Porque és soberana, rainha só
Ninfa real da Alta Paulista
Que o coração prende e
conquista.
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