A lembrança de um homem (10 de abril de 1974)
Decorria o ano de 1944.
Encontrava-me na Itália. Era
eu um dos 25.000 soldados de nosso Exército, que integrava a gloriosa Força
Expedicionária Brasileira, na luta armada e sem tréguas da II Grande Guerra
Mundial.
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Haviam-me esvaido, quase que
completamente, as esperanças de sobrevivência. O bombardeio ensurdecedor, nos
momentos alucinantes dos combates, frangalhava os nervos, conturbava as mentes.
O medo teimava muitas vezes em antepor-se à razão e até ao próprio instinto de
conservação, condição nata das criaturas humanas. Obuses e estilhaços faziam
vítimas, seccionando membros, dilacerando corpos. O espectro da morte abria um
manto, tentando sempre aumentar o seu reino.
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Foi após um desses duros
combates que recebi uma carta. De Marília. Portadora de esperança, de conforto,
de notícias familiares. Conduzia também um pedido: que eu escrevesse, sempre
que possível fôra, algumas crônicas ou matérias de observação, sobre a guerra,
sobre os pracinhas brasileiros. A solicitação, dizia-me o missivistam, meu
querido mano Alcindo (Braos Padilha), partira do
diretor do jornal “Correio de Marília”, senhor Raul Roque Araujo.
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Manuscritas, em pedaços de
papel inadequedo, rabisquei alguns trabalhos jornalísticos, que foram
posteriormente publicados por este jornal.
Findou-se a guerra. Com as
mercês de Deus, com a saúde abalada, trazendo comigo a herança maldita da
psicose de guerra, vim ter a Marília.
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João Neves Camargo era o
prefeito. Venâncio de Souza, presidente da Sociedade Amigos de Marília. Basileu
de Assis Moraes, presidente da Comissão de Recepção aos pracinhas marilienses.
E Marília recebeu,
condignamente, seus heróis de guerra. Como também o Brasil todo. Embora hoje
eles não passem de cidadãos simples, valentes defensores da Liberdade e
Democracia, aos quais a Pátria, ao envés de ser Mãe, tornou-se madrasta.
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Findas as homenagens que o
povo de Marília tributou aos seus pracinhas, fiz em nossa cidade minha primeira
visita: ao sr. Raul Roque Araujo, diretor do CORREIO DE MARÍLIA.
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Foi um colóquio gostoso, foi
o nascimento de uma amizade e de uma simpatia recíproca. Foi o recontacto com a
redação de um jornal e o cheiro acre das tintas tipográficas. Quando me
despedi, saí convencido de que havia encontrado um amigo.
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Algum tempo depois, o grande
e saudoso jornalista Luiz Franceschini deixava o jornal para transferir-se para
São Paulo. Henrique Baptista Júnior substituira Franceschini, mas por pouco
tempo.
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Já era o ano de 1946.
Eu havia ingressado como
funcionário do Banco Mercantil de São Paulo S.A., quando Raul Roque Araujo
mandou chamar-me:
- Quero que você saia do
Banco para assumir a secretaria de redação do jornal – foi o que falou.
Sai do Banco. Entrei no
“Correio de Marília”.
Aqui estou.
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Hoje, 10 de abril, fazem 10
anos que o sr. Raul Roque Araujo faleceu.
Foi a razão dessa lembrança.
A lembrança de um homem.
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