Manguinhas de fora (22 de janeiro de 1977)
Começo do ano de 1964.
Situação nacional intranquila. Jango e Brisola permitindo que assalariados de
Moscou bagunçassem o coreto.
Maus brasileiros, sobretudo
maus patriotas, exultavam: “comunismo vai entrar”.
Vagabundos, mas seguidores da
doutrina exótica, preparavam-se para “receber” residências e fazendas daqueles
que ganharam-nas com um trabalho suado, fruto de anos de trabalho constante.
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Caboclo, ingênuo, ignorante
de tudo o que ouvia dizer e que não entendia, conversava com o outro:
- Cumpádi, diz-que u tár di
cumunismo vem aí.
- Dêxa vim, qui nós avacáia
êli.
E o outro, mais curioso,
queria saber o que era mesmo o comunismo que se anunciava que viria e o que
representaria afinal.
Pergunta ao compadre da
cidade, homem que lia jornais, ouvia rádio, assistia televisão e conversava com
o farmacêutico e o gerente do banco.
E o homem da cidade explicou,
então, ao ingênuo matuto:
- O senhor me dá a palha de
milho, o fumo de corda, o canivete. Eu pico o fumo, desfio ele, enrolo o
cigarro, ponho na boca. Você me empresta o fósforo ou isqueiro. Eu acendo o
cigarro e pito. Isso é comunismo.
Indagou o outro:
- O fumo é meu, a páia é
minha, o fórfe é meu, o canivete é meu, mecê faiz u cigarro cum o meu materiá e
pita… i eu u que faço?
-
Você cóspe… isso é comunismo.
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Mas
o outro caboclo não havia entendido e desejava saber melhor sobre o assunto.
Então
lhe explicaram:
-
Comunismo é a igualdade para todos, assim, o que é teu, é meu. Mas o que é meu,
é meu mesmo, entendeu?
-
Você, di qui nação é?
-
Eu sô mistura di pernambucano com baiana.
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E o
outro dizia com certo falso orgulho e caracterizada insegurança:
-
Eu já sô di bem longi… sô di Macapá, sábi? É longi pá pésti… lá pru ladu di
Goias, mais mais pertu di Curibita…
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Dois
assistentes, boquiabertos. O início. Depois, a assistência cresceu mais. Eram
uns quatro ou cinco. E o homem bazofiava. Falava. Empolgava os incautos que
ouviam tudo. E ele crescia.
Contou:
-
Uma veiz tive nu Japão. Vocês precisam ver como é difícil comer com pauzinho…
Todo
mundo riu.
O
homem era um encanto.
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Casualmente,
eu ouvia tudo. Parecia não ouvir, porque fingia que lia.
Mas
ouvia. Deliciava-me por dentro.
Mas
acabei “explodindo” contra o homem, quando ele disse a maior mentira deste ano.
Disse
que era jornalista!
Extraído do Correio de Marília de 22 de janeiro de 1977
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