Uvas que estão azedas... (9 de agosto de 1973)
Conversava eu outro dia, em
Brasília, com um sargento da aeronáutica radicado em Minas Gerais, mas carioca
de nascimento.
No decurso da conversa normal
e espontânea, veio à baila o regionalismo nacional e o militar não se pejara em
afirmar-me, que em São Paulo os paulistas não gostam de cariocas.
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Lembrei-lhe que era o
inverso: no Rio, geralmente, os cariocas não apreciavam muito os paulistas e
que o fenômeno, sem razão de ser, datava desde o ano de 1932.
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A palestra desse jaez havia
surgido na ocasião, face ao fato de que, representações esportivas de 25
Estados que se encontravam em Brasília, haviam vaiado estrondosamente os paulistas,
quando estes exibiram um número de folclore, no Ginásio “Presidente Médici”.
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Disse ao sargento carioca,
que eu havia residido ocasionalmente no Rio de Janeiro, por cerca de meio ano e
que havia tido a oportunidade de sentir um certo escárnio e indiferença pela
gente de São Paulo. Não dera a menor importância ao fato, mas percebera isso
muito bem.
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E fui mais além:
Citei a circunstancia de que,
lá mesmo em Brasília, onde se realizavam os V Jogos Estudantis Brasileiros, a
maioria dos demais estados, “torciam” contra São Paulo, em todas as competições
em que os paulistas intervinham.
Quando se notavam um outro
Estado, “torcendo” por São Paulo, uma coisa era certa e matemática: a
representação que “torcia” a favor dos paulistas, tinha interesses nas derrotas
dos adversários de São Paulo.
Ninguém contestou.
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Fui além ainda.
Expliquei ao militar, que de
minha parte achava isso muito natural, porque em verdade, traduzia-se numa
espécie de ciúmes contra São Paulo, sem favor algum, o Estado líder da
Federação, em todos os pontos.
Exemplifiquei o caso da
raposa que não podendo alcançar os cachos de uva na beira da estrada,
justificou o insucesso alegando que as uvas estavam azedas.
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Lembrei que a Comissão
Organizadora dos Jogos, não conseguiu adquirir, em todas as lojas de Brasília,
o número, suficiente de lençóis e cobertores para os atletas, tendo sido
necessário a ida de gente à São Paulo, para comprar os aludidos utensílios.
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Falei que a antipatia e a
inveja por São Paulo, tinha razão de ser, pelo inimitável poder econômico do
Estado bandeirante, cuja força produtora sustenta em geral os demais Estados do
País.
Lembrei o fato de que, no
norte e nordeste, por exemplo, até a salsa e a cebolinha, para o simples
tempero de uma carne, provem de São Paulo.
E dei o “xeque-mate”.
- Sargento, veja porque dessa
antipatia contra São Paulo: os sapatos, as calças, as camisas, as roupas, os
remédios, quase tudo que nos demais pontos se adquirem obrigatoriamente, são de
São Paulo. Essa é a razão da turma toda ficar “mordida”. Turma que não entende
que tudo é Brasil. Que todos são brasileiros. Que a Pátria é uma só, como bem
disse Ruy Barbosa. Da mesma maneira que São Paulo admira as belezas das praias
de Copacabana, de Tambaú na Paraíba, de Sete Coqueiros em Maceió, da Boa Viagem
em Recife, como os costumes e tradições nordestinas, a historia dos candangos,
os quitutes da Bahia, os demais Estados deveriam, não só admirar, mas
orgulhar-se do poderio econômico de São Paulo, do trabalho de sua gente
cosmopolita, da demanda da mão de obra, do poderio das iniciativas
governamentais e particulares.
Extraído do Correio de
Marília de 9 de agosto de 1973
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