Hoje a comida é diferente (31 de agosto de 1973)



Já foi o tempo em que existia um organismo denominado Guarda Nacional, integrado por políticos, na maioria semi-analfabetos, que o grosso do próprio povo empavonava e respeitava por simples temor.

Naquele tempo, o cidadão que tivesse muitos mil pés de cafeeiros, ou muitos alqueires de pastagens com milhares de cabeças de gado, era conclamado “chefe político”.

E como tal, recebia um título de mãos beijadas.

Daí, a razão da existência dos “capitães” e “coronéis”, muitos dos quais insubmissos do Exército, ou simplesmente reservistas de terceira categoria.

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A situação criou um mito, que se estendeu por muitos anos, num período em que o próprio país, mercê dessa burrice toda, cingia-se a uma sistemática política, das mais carcomidas e sórdidas, entravada, firmada num alicerce de prepotência e de imbecilidade.

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As eleições foram transformadas em verdadeiras farsas, com um eleitorado de cabresto, que comia e bebia à rodo nos dias de pleito, para votar bitoladamente, à gosto dos “coronéis”.

Em alguns lugarejos, capatazes de “coronéis” de rabo-de-tatu em punho, determinavam o sufrágio “na marra”.

Autênticos “testas-de-ferro” faziam mudar o resultado das urnas, constando votos dados até por eleitores falecidos.

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Era a época que o defunto votava.

Hoje a comida é diferente.

Embora alguns ainda não se tenham apercebido disso, e, por caminhos diferentes imitem à distancia fatos pretéritos, auto-acolhendo uma autoridade desmedida ou mesmo falsa.

Acontece, sim.

Até em Marília.

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A imprensa teve um papel preponderante na mutação do mencionado e abjeto “regime”.

Mas não foi fácil.

Jornalistas lutaram idealística e patrioticamente contra essa série de desmandos. O direito da força venceu muitas vezes a força do direito.

A mando de “coronéis”, jornalistas foram espancados e “providencias” foram tomadas para silenciar jornais que se opunham ao processamento de tamanha imoralidade nacional.

E a razão acabou por vencer.

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A política hoje, em alguns casos ou alguns políticos, parece ter um leve arraigamento do passado. Sob outras formas.

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Prova disso, a “psicose de processamento”, que ainda se verifica em muitos de nossos políticos.

Os maus políticos têm sido, sempre, criticados e agulhados pela imprensa. Seus átos têm sido dissecados impiedosamente. Não com o escopo de ridicularizar, mas sim o objetivo de mostrar-lhes o chamamento à razão e a diferenciação do ridículo e dos maus serviços.

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E a “psicose de processamentos” acabou vigenciando.

Já “largaram” dezenas de pretendidos processos-crimes contra Carlos Lacerda. Contra Assis Chateaubriand. Contra David Nasser. Contra Júlio Mesquita. Até Ruy Barbosa. E muitos outros.

Nenhum “pegou”, mesmo porque a Lei de Imprensa comina três crimes graves. E jornalista que é jornalista, não incorre em nenhum deles.

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Mesmo nesta era atômica e espacial desde século XX.

Mesmo atualmente.

Mesmo em Marília.

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Tem políticos alimentando ainda a “psicose de processamento”.

Em substituição a um trabalho em pról da cidade, trabalho que muitos deles não têm a suficiente competência de desobrigar, propalam a idéia de “processar” jornais e jornalistas marilienses.

Só porque os jornais e os jornalistas, como lídimos porta-vozes da opinião pública, relatam o que todo mundo sabe e vê.

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A imprensa mariliense não se atemoriza nem um tinquinho.

O povo está ao seu lado, contra as más causas, empossadas pelos maus políticos.

Também a lei.

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De nossa parte, iremos em frente.

Marília representa para nós, muito mais do que os maus políticos.

Hoje as comidas são diferentes.

Extraído do Correio de Marília de 31 de agosto de 1973

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