A desbriada corrida altista (13 de fevereiro de 1960)



Inegavelmente, o assunto encerra uma equação indeterminável, a desafiar a argúcia dos govêrnos e a capacidade de seus auxiliares mais diretos. Assunto insolúvel, questão de trabalho ou motivo de vergonha? Não será, por outro lado, uma urgência daquilo que se enquadra claramente na exigência de um maior patriotismo?

Parece-nos que nos falta um pulso mais firme, uma orientação mais sadia, mais direta e mais efetiva. Ou um plano de ação (com licença do sr. Carvalho Pinto) mais equânime, mais racional, irradiado em todos os setores. Êsse negócio de amparar de maneira direta e decisiva a indústria automobilística, deixando ao sabor da própria sorte os demais ramos manufatureiros, é o mesmo que trancar bem a porta da frente de uma casa, deixando aberta a porta dos fundos. Um contra-senso, vamos ver mais claros.

A questão de Brasília é outro “nó górdio”. Pelo menos, no entender de muitos. De nossa parte, repetimos mais uma vez, não somos contra Brasília e sim aversos ao sistema alucinado de sua construção “à jacto”, extra orçamentária, caríssima, exigindo seguidamente novas emissões, novos encargos de dívidas extraordinárias. É verdade que se deve fazer hoje aquilo que deveria ser feito amanhã. Mas dentro do cabível, da lógica, do senso, convenhamos.

Ninguém poderá negar que o atual presidente da República, irretorquivelmente obcecado na “feitura” da nova Capital, tem ressentido falta de mais tempo para dedicar-se às demais contas do imenso rosário de necessidades brasileiras.

Isso, sem contar-se com o ensejo que tal “construção” vem propiciando a dezenas de safados, que enriqueceram e estão enriquecendo à custa do próprio erário oficial e em detrimento à miséria dos nacionais.

Enquanto tal vai acontecendo, a desbriada corrida altista caminha em ascensão pirotécnica em todos os sentidos e em todos os setores. É o reflexo inconteste de um desgovêrno. Ninguém, pelo menos até aqui, foi capaz de erguer um dique estancatório ao movimento incrível da alta dos preços das coisas e utilidades de primeira urgência. Para exemplo, estão trombeteando por aí mais um “aumentozinho” de 30 a 40% nos preços dos medicamentos em geral. Os calçados, segundo consta, terão também em breve a sua vez. Idem os vestuários em geral. Hoje em dia, ganha menos o comerciante que não remarca semanalmente os artigos que vende. Sinal dos tempos?

Pode ser sinal dos tempos, mas ninguém nos convencerá que tal estado de coisas é a sombra perfeita de um perfeito descontrôle, que parte, antes e acima de tudo, “de cima”; isto é, dos próprios poderes públicos. Os órgãos fiscalizadores e controladores de preços, como a famigerada COFAP e suas “filhas” COAPS e COMAPS, poços de inércia, apresentam injustiçada e seguidamente, aquilo que se chama os efeitos do tiro pela culatra. A não fixação do preço mínimo para o produtor nacional, com a limitação do preço máximo para o consumidor, com média controlada para o intermediário, os elevados preços de transporte e a incompleição de meios de escoação, são, não há dúvida, os fatores mais importantes e mais responsáveis pela desbriada corrida altista que sufoca os brasileiros e que classifica nosso país na pejorativa condição de u’a nação onde a vida é das mais caras no mundo e onde a moeda é das mais raquíticas.

No Brasil, embora não seja segrêdo para ninguém, tudo sobe diuturnamente; tudo, menos o índice de vergonha de muita gente!

Extraído do Correio de Marília de 13 de fevereiro de 1960

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