Um intercâmbio interessante (6 de maio de 1959)

Não há muito, folheávamos, por simples curiosidade, um adento à uma edição de importante matutino paulistano. Um suplemento feminino.

Sabido é que os homens, ao manterem contacto com coisas de mulheres, o fazem mais por curiosidade do que por uma coincidência qualquer. Foi o que sucedeu conosco.

Manuseando o aludido periódico há vários anos ininterruptos, jamais demos a menor importância ao citado caderno, objeto êsse que sempre se nos pareceu destituído de qualquer atração.

Detivemo-nos cuidadosamente e com tempo, à leitura de tal compêndio e percebemos, dêsse nosso observar, que o aludido objeto, sem nenhum atração para nós, “barbados”, está eivado de utilidades e interêsse para o sexo fraco.

Receitas de forno, fogão e outras, além de instruções e conselho diversos, são ali inscritos com clareza e simplicidade.

O assunto que nos chamou a atenção, entretanto, não foi êsse; foi uma secção de correspondência pública, em letras de fôrma. Foi o espírito de sinceridade e o desejo de prestatividade que alí vimos delineados. Pudemos perceber, dentre centenas de recados e “cartas” de mulheres de todo o Brasil, uma coisa agradável, deliciosa, que o desejo de servir o próximo, a intenção de ser útil e de fazer o bem.

Mulheres desde o Amazonas até o Rio Grande do Sul, trocam entre sí idéias, favores e referências aos sentimentos alheios e ao espírito de cooperação e união fraternal.

Perdemos, como dissemos, bons minutos vendo a aludida secção desse suplemento. E apesar de toda a tradicional e reafirmada vaidade feminina, só pudemos perceber a intenção sadia de cooperação entre as leitoras do órgão aludido, numa demonstração inequívoca do intuito de ser útil.

Uma, pedindo o modêlo de um vestido, a receita de ponto de tricô, o módo de fazer um bôlo, ou sistema de enfeitar u’a mesa de aniversário. Outra, desejando um conselho para a educação de um filho ou o molde de um vestuário para criança; outra, ainda, mais gentil, oferecendo suas aptidões acêrca de uma série de empreendimentos úteis para o lar, a família e a mulher.

Vimos nisso uma auréola de carinho, o verdadeiro tóque feminino, aquele afeto próprio da mulher. E gostamos disso. Apreciamos a sinceridade de propósitos e a espontaneidade das manifestações.

De pureza claríssima de sinceridade inatacável, as mulheres que se servem do referido veículo de intercâmbio de idéias, ações, pensamentos e bondade, despem-se de egoísmo, da vaidade, de qualquer resquício de prepotência, nivelando-se todas, sendo todas iguais e todas desejosas de aguardar, mais dando do que recebendo.

Vimos, nesse simples processo, o verdadeiro espírito de fraternidade e o conhecimento dêsse intercâmbio de idéias, nos garantiu a certeza de que existe muita gente boa no mundo, gente interessada em servir o próximo. Percebemos oferecimentos de coisas valiosas, que, normalmente, deveriam ser guardadas de maneira até ávara. Vimos, nas linhas e entre-linhas das manifestações de diversas pessoas, a destituição de qualquer preconceito e o sentimento de igualdade, paradigma inconteste do real ideal pregado por Cristo.

Gostamos desse intercâmbio, principalmente tendo-o apreciado, lógo a seguir da observação de um outro, numa revista editada no Rio de Janeiro, em que o intercâmbio de idéias é completamente abjeto: onde homens e mulheres; e oferecem reciprocamente, numa linguagem de aparência inocente e por vezes velada, jamais isenta do espírito do interesse do dinheiro, do divertimento ou do sexo.

Extraído do Correio de Marília de 6 de maio de 1959

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