A Igreja e a Reforma Agrária (20 de dezembro de 1958)

O problema da Reforma Agrária, no Brasil, é bem mais idoso do que possa parecer à primeira vista. Do mesmo já se ocuparam estudiosos diversos que o abordaram e focalizaram-se sob diversos prismas e aspectos.

Muita gente se ocupou da questão referida: estudiosos, pseudo-estudiosos, bem ou mal intencionados, políticos ou não, até demagogos e preconizadores de doutrinas políticas aversas ao regime nacional.

A Reforma Agrária, executada conforme deve ser, sem que sirva de motivos de exploração ou aproveitamento para politiqueiros profissionais, que se enquadre em seus objetivos, precípuos, de amparo e fixação do homem do campo, dentro de seu próprio “habitat”, estancando o nocivo êxodo rural, é boa e necessária.

Muitas explorações têm sido realizadas em torno dêsse problema, que, apesar do sentido patriótico que apresenta, não escapou ao manuseio de politicagens e de politiqueiros.

Agora, a própria Igreja, talvez preocupada não só com o problema em si, mas com o andamento de idéias que em torno do mesmo se realiza, sem nenhum resultado de efetividade, resolveu também tomar parte nessa questão. D. Helder Câmara, Arcebispo Auxiliar do Rio de Janeiro, afirmou recentemente, em entrevista à imprensa:

“A Igreja fará a reforma agrária. O problema é complexo e não sòmente da Arquidiocese do Rio de Janeiro. Sua execução e solução dependem de uma completa concatenação de forças oriundas de todas as dioceses do Brasil”.

Acrescentou que a Igreja dará toda a assistência técnica e financeira às famílias que se deslocarem para o Interior, a fim de habitarem terras oferecidas pelas arquidioceses e dioceses brasileiras. Casas simples, mas confortáveis, serão construídas em pleno sertão brasileiro. Transporte será fornecido e instrumentos de trabalho serão distribuídos e cada família receberá gratuitamente assistência alimentar durante os primeiros tempos de trabalho.

Mais adiante o arcebispo auxiliar do Rio de Janeiro declarou: “a hora ainda não chegou, mas no momento oportuno virá a reforma agrária. A Igreja de Jesus Cristo será a primeira a dar o exemplo de pôr em prática a doutrina social-cristã. Os problemas sociais se avolumam dia a dia, os homens vão cada vez mais ficando apalermados diante da brutalidade da vida. Cumpre, portanto, à Igreja, orientá-los e encaminhá-los por um caminho seguro. Para isso tem ela a experiência adquirida em dois mil anos de lutas em todos os quadrantes da terra”.

Finalizando d. Helder asseverou: “Faremos sem dúvida a reforma agrária no Brasil e será para breve, muito breve mesmo. Não há tempo a perder. A Igreja está estudando o assunto. Medidas estão sendo tomadas e qualquer hora poderei chamar os jornalistas e dizer-lhes: “Seguiram as primeiras famílias que irão habitar em terras próprias cedidas pela Igreja”.

A idéia, como se vê, principiou a preocupar a Igreja Católica, numa demonstração evidente de que o problema é digno de atenções e que suas providências estão a exigir mais do que simples figurar em estatutos de partidos políticos ou servir de ilustrações demagógicas para candidatos à pleitos.

Vamos, pois, aguardar o desenrolar dessas providências, óra preconizadas pelo Arcebispo da Capital Federal.

Extraído do Correio de Marília de 20 de dezembro de 1958

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