Prudência e serenidade (27 de setembro de 1958)

É natural do próprio homem as mutações momentâneas. As circunstancias transformam homens e grupos, estando a própria História cheia de exemplos: Nero, Ulysses, Mussolini e mesmo Perón e Getúlio, são a prova disso.

Segunda-feira passada, por ocasião de um comício político na cidade, vimos divergência de idéias de dois grupos. Divergências éssas perfeitamente normais, mercê da democrática atmosfera em que vivemos, que faculta a quem-quer-que seja, pensar livremente e livremente agir, desde que, dentro dos preceitos assegurados pela própria Carta Magna de nossa República. E disso tivemos a corroboração, quando a própria polícia, que estava executando os trabalhos de prevenção pública, sob a direção pessoal do delegado Severino Duarte, isolando as duas correntes, permitiu e garantiu a livre manifestação de ambas, numa demonstração irretorquível da preservação dos postulados emanados pelo nosso regime atual.

Não nos compéte a análise das condições verificadas na oportunidade. Igualmente não pretendemos insinuar de qual parte esteve o êrro, porque tudo aquilo que aparentemente se apresenta como erro, tem lá no fundo algum resquício de razão. Nos conta o próprio Código Penal, através das interpretações dificílimas de seus artigos, que mesmo os crimes praticados com os mais aparentes e claros requintes de selvageria, ostentam, lá no fundo, uma razão de ser, deparando, no delineamento dos preceitos dêsse maravilhoso Código, atenuantes certas e sérias, pejorativamente chamadas de “válvula de escape”.

Dissemos em nosso artigo de quarta-feira (24/8/1958), que o policiamento foi merecedor de louvores, pela maneira serena e precisa como se conduziu na ocasião, permitindo e garantindo, legalmente, as duas manifestações contrárias. Sinceramente, nós, do ponto de vista de observadores, apreciamos a atitude da milícia, porque entendemos a situação alteada e algo melindrosa, quando, qualquer atitude menos pensada, poderia criar um verdadeiro cáos, de consequências talvez imprevisíveis em nossa cidade.

Mais dois comícios políticos de interesse de partes, estão programados, sendo um para hoje e outro para amanhã. Mister se faz que utilizemos, nós, o povo mariliense indistintamente, a máxima prudência e calma, como tão democraticamente acaba de apelar a maior autoridade de nossa comarca, o íntegro Juiz de Direito local, dr. José Gonçalves Santana.

A melhor maneira de serem refutados pontos de vista contrários, externados por candidatos em praça pública, é responder com o voto.

O eleitor consciente, aquele que não é autônomo, que não é “dois de paus”, que não é escravo de partido e que não está interessado em empregos, dinheiro ou outras vantagens, já tem, com toda a certeza, seu ponto de vista formado. Palavras ocas ou vãs, pensamos, não alteram o ponto de vista firmado na mente de um homem moralmente são e eleitoralmente consciente.

Marília, que já deu exemplos sobejos de civismo e que, embora com razões justificáveis, apresenta aos olhos do público, como desdouro, o desagradável acontecimento futebolístico verificado no passado, deve provar sua independência de pontos de vista, seu alto teor democrático, sem manifestações que possam ser mal interpretadas e redundarem em consequências funestas.

Embora com excessos, verdade se diga, as manifestações de segunda-feira última não acarretaram consequências maiores, mas poderiam ser evitadas e desenvolvidas de outra fórma.

Extraído do Correio de Marília de 27 de setembro de 1958

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