Ainda os “pracinhas” (15 de julho de 1958)

Verdadeiramente, o autor destas linhas pode ser considerado suspeito para comentar o fato desta crônica, como “pracinha” que é. Entretanto, para os que sabem melhor compreender a função do jornalista e interpretar suas atividades imparciais no abordar um assunto, a questão muda de figura.

Voltamos ao assunto, em virtude de termos recebido incontáveis manifestações de apreço, tanto de “pracinhas” como de suas famílias, políticos, amigos e outros marilienses. E, sem falsa modéstia, dizemos que ficamos desvanecidos com a solidariedade que nos chegou, sem termos recebido u’a única manifestação de ponto de vista contrário.

Um amigo ficou admirado, de que em nosso comentário anterior, tivéssemos afirmado que quando da chegada dos “pracinhas” nem todos receberam sequer um passe de segunda classe para retorno aos seus lares. Pois aconteceu, realmente. E é fácil averiguar, aqui mesmo em Marília, onde existem mais de 20 ex-combatentes.

Com referencia ao número de leis de amparo aos “pracinhas” da FEB, confirmamos o que dissemos: possuímos em nosso poder um livro intitulado “A Legislação dos Ex-Combatentes” e no mesmo consta um compêndio cronológico de leis e decretos da União e de diversos Estados, diplomas êsses beneficiando, em diversos pontos, os ex-combatentes. Todavia, o aludido volume está incompleto, porque se trata de uma edição de alguns anos passados e daquêle tempo para cá outras incontáveis leis foram aprovadas e ali não estão incluidas.

Já dissemos uma vez e tornamos a repetir: O presidente da República deveria assinar uma lei com a seguinte redação: (“)As leis de amparo aos ex-combatentes são leis mesmo e como tal devem ser cumpridas”. Se isto acontecesse, os “pracinhas(”) também teriam suas casas próprias (mediante empréstimos amortizáveis a longo prazo e não “na faixa” como os campeões de futebol); teriam facilidades de ingresso no funcionalismo (não favores e sim como medida indiscutivelmente legal), dentro de suas qualidades intelectuais e técnicas; radicar-se-iam a lavoura, mediante garantias, os que assim pretendessem; etc., conforme prevem inúmeras leis.

O autor desta coluna, como ex-presidente e ex-secretário da Secção local da Associação dos Ex-Combatentes do Brasil, viu-se na contingência de advogar direitos de vários ex-companheiros, com fundamento em dispositivos legais, junto aos Governos da União e do Estado e confessa, sem o menor pejo, de que o único caso que conseguiu foi o do ex-“pracinha” Augusto Gonzaga Moura, o conhecido “Donga” e assim mesmo sem estabilidade, sem salário família, sem direito a empréstimos, sem efetivação, sem outras inúmeras condições necessárias para garantir a sua permanência no quadro do funcionalismo efetivo. Assim mesmo, foi preciso a colaboração intensiva e desinteressada de políticos e autoridades locais, como Prefeito, Presidente da Câmara, Vereadores, diretórios políticos, etc.. Está certo isso?

Fazemos aqui uma ressalva necessária, quanto aos homens que exercem os cargos de prefeitos de Marília, como João Neves de Camargo, Adorcino de Oliveira Lyrio e Argollo Ferrão. Êstes cidadãos e marilienses, sempre se preocuparam com os “pracinhas” e procuraram, nas medidas do possível, amparar diversos dêsses heróis.

Mas como dizíamos, na qualidade de um dos diretores da secção local da Associação dos Ex-Combatentes, advogamos muitos direitos de antigos companheiros. Direitos e necessidades. E sabem os leitores quantos conseguimos traduzir em realidade? Pois pasmem: Nenhum!

E não fizemos, jamais, pedidos absurdos, pretenciosos. Solicitamos, sempre citando preceitos legais (vigentes, frise-se) e baseamos os pedidos dentro das condições e qualidades técnicas de cada pretendente; isto é, não cogitamos de conseguir um alto emprego público, de carater burocrático, por exemplo, para um semi-analfabeto. Tentamos não nos expormos ao ridículo, medindo bem e antecipadamente os fundamentos das pretensões. E, mesmo assim, ninguém nos atendeu.

Sabemos de casos de até prisões, para ex-combatentes que insistiram em que determinadas leis fossem cumpridas! Conhecemos casos de punições funcionais, a servidores que pretenderam melhoria de vida dentro do funcionalismo!

Por isso e por outras razões (que são inúmeras), é que os “pracinhas” de todo o Brasil, num movimento iniciado no Rio de Janeiro, estão se insurgindo, democraticamente e em têrmos, contra os govêrnos. Em face de uma série de excessos que se estão cometendo com respeito a grande diferença da ingratidão existente entre as honras dispensadas aos atuais campeões do mundo e aquelas que são devidas por fato e direito aos “pracinhas” da FEB.

Extraído do Correio de Marília de 15 de julho de 1958

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