10 milhões que não eram 10 milhões (18 de junho de 1958)

Aconteceu há pouco em São Paulo. Assim noticiaram diversos vespertinos.

Um cidadão esqueceu, no aeroporto de Congonhas, determinado pacote, que foi recolhido à secção de bagagem. Pouco depois apareceu o cidadão referido, esbaforido, procurando o objeto olvidado. E ante a incredulidade dos funcionários do aeroporto, o mesmo teria declarado que naquêle embrulho estavam empacotados 10 milhões de cruzeiros. E que a aludida importância destinava-se a custear despesas políticas da campanha eleitoral do sr. Carvalho Pinto.

A notícia, como seria de esperar, teve uma repercussão verdadeiramente fantástica. Foi difundida à larga, com algumas piadinhas de ironia, “verve” e satirismo. Glosaram o esquecido e abordaram a questão sob ângulos disversos.

Estava nesse pé a situação, quando o proprietário do fabuloso pacote compareceu à redação do “Diário da Noite”, em São Paulo, para esclarecer a verdade. Eis as declarações do mesmo:

- “Com referência à notícia publicada por alguns órgãos de imprensa, a bem da verdade tenho a esclarecer que o pacote encontrado no aeroporto de Congonhas era de minha propriedade, mas, em absoluto, não continha dinheiro nem declarei qual o seu conteúdo. O reporter que espalhou a notícia foi insensato quando asseverou o contrário. Agricultor e comerciante, não iria transportar em espécie tão avultada importancia, quando existe meio seguro de fazê-lo”.

Prosseguindo, declarou o sr. Luís Fausto Junqueira:

- Ao investigador de polícia que efetuou a entrega, afirmei que o volume realmente continha brindes de grande valor, remetidos por um riberopretano, residente na Capital Federal, para serem oferecidos aos vencedores dos primeiros jogos abertos da Alta Mogiana, a serem realizados, em Ribeirão Preto, na primeira quinzena de julho próximo”.

“Procuraram fazer exploração política e deram uma outra interpretação ao telefonema para o Palácio dos Campos Elísios, que tinha como finalidade justificar o atraso de minha esposa a uma entrevista com a esposa do governador do Estado, para tratar de assunto de carater filantropico da cidade de Ribeirão Preto. Tudo mais constitui pura fantasia do reporter aludido. O investigador Luís Evangelista Silva agiu com correção e merece, portanto, um elogio” – encerrou, assim, as suas declarações o dono do “pacote com dez milhões”, que não passou de pura “barriga”.

De tudo isso, concluímos que de fato existiram intenções de exploração política em torno do assunto, a menos que o reporter incumbido de espalhar a “novidade” seja muito ingênuo. Em todo o caso, deve prevalecer a primeira hipótese, como mais adaptável aos tempos atuais e ao momento presente.

Isso vem provar aquilo que temos dito repetidas vezes nesta coluna: O brasileiro é obrigado a desconfiar das incontáveis modalidades da divulgação política atual. Vale tudo agora!

Extraído do Correio de Marília de 18 de junho de 1958

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O jogo do bicho (26 de outubro de 1974)

O Climático Hotel (18 de janeiro de 1957)

“Sete Dedos”, o Evangelizador (8 de agosto de 1958)