Construir & Destruir (17 de abril de 1958)

Certa feita, fomos censurados, porque utilizamos de um recurso próprio do jornalismo: dissemos que não tínhamos assunto para uma crônica e com a negativa previamente confessada, terminamos por escrever nosso habitual comentário.

Usamos alguma coisa de filosofia, sem nenhum sofisma – mesmo porque o caboclo não sabe sofismar, como não sabe fingir, nem bajular.

Hoje, somos forçados a empregar o mesmo método, isto é, escrever alguma coisa para plenar o espaço que nos é reservado, filosofando (sem sofismar), sôbre uma única frase.

Ouvimos, sem participar da conversa, uma pessoa dizer à outra, referindo-se a um cidadão muito conhecido em Marília: “Admiro fulano, porque êle sempre procura construir e jamais destruir em Marília”.

O assunto nos deu a pensar, principalmente à nós, que temos a pessoa penhorada na expressão supra, como um grande amigo, dos mais comuns e sinceros. Apesar de conhecê-lo, de com êle privar quase cotidianamente, não tínhamos até então, acurado o raciocínio numa análise mais profunda e elevada; cingiamo-nos apenas a conhecê-lo como todos o conhecem: bom, trabalhador, honesto, pobre e bem intencionado, bom chefe de família e cumpridor de seus deveres.

Fomos, em pensamento, mais além. Vasculhamos, sem qualquer motivo de curiosidade malévola, numa detenção de atenções sinceras e imparciais, o caminho palmilhado por essa pessoa. Concluímos tratar-se de um cidadão de qualidades morais mais elevadas do que à primeira vista aparenta. Numa década (ou pouco mais) de residência entre nós, conseguiu escrever páginas luminosas de amor ao próximo, de bons exemplos, de trabalhos insanos e sinceros em pról de Marília da gente mariliense.

Homem popular, jamais se engrandeceu dessa condição. É humilde por índole, por natureza. É simples e amoroso conforme ensina o próprio Evangelho. Está sempre disposto a colaborar, a dedicar-se ao próximo. E o faz sem espalhafatos. Centenas de pessoas já precisaram de seus préstimos e êsse mesmo número já sentiu o calor de sua presença(,) sua palavra amiga e sua ação despretenciosa. Inimigo de publicidade, despido de vaidades pessoais, está presente sem aparecer ostensivamente e sabe fazê-lo em tôdas as circunstâncias.

De fato, essa pessoa só construiu em Marília. Jamais destruiu ou pactuou de nenhum motivo de regresso de nossa cidade ou nosso povo, nunca teve uma palavra de hostilização para quem-quer-que seja. De nome é conhecidíssimo. De ações, idem. Mas é quase anônimo, porque é humilde, porque não é fanfarrão nem vaidoso. Serve ao próximo, como sua própria família.

Não é um homem diferente, uma raridade. É apenas um homem direito, normal, cuidadoso, exemplar, honesto e trabalhador. Bom chefe de família, excelente educador dos próprios filhos.

Quem nos fez assim melhor analisar essa pessoa, foi um cidadão comum. Conhecidíssimo, também. Popularíssimo, igualmente.

E ficamos pensando então: Como seria melhor Marília, como não seria melhor o mundo, se todos ou pelo menos a maioria dos homens, pensasse mais em construir do que destruir? Êsse homem é um exemplo. Brilhante, frente a alguns outros, que, aqui vivendo, aqui tendo feito nome e estabilidade financeira, não perdem vaza em destruir, criticar, censurar, espezinhar ou ridicularizar o próximo.

Aliamos uma coisa a outra; os dois extremos da questão. Enquanto êsse homem se esfalfa em boas ações, em defender Marília, seu povo e suas causas, dando atenções ao mais humilde mendigo que encontra pelas ruas e conversando igualmente com os mais representativos homens do govêrno, outros, aqui entre nós, tudo procuram destruir, tudo procuram destruir, tudo procuram torpedear, conspurcar, confundir. Criar inimizades, separatismo, combater lutas honestas. Aumentar a confusão, ao invés de contemporizá-la, atenuá-la.

A vida é assim mesmo – dizem por aí.

Se todos pensassem do mesmo modo, o mundo não teria graça – arrematam outros.

No entanto, se todos tivessem mais nobres ideais, melhores pensamentos, mais lucidez e melhor educação, as coisas seriam diferentes.

Êsse homem que nos referimos é um exemplo. E existem outros tantos – se bem que poucos – por aí. É só procurá-los e mirar-se neles...

Marília seria bem diferente então.

Extraído do Correio de Marília de 17 de abril de 1958

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