Legendas de caminhões (29 de janeiro de 1958)
Afir(m)a a ciência grafológica, que todo ser humano emite, nos conceitos que escreve, um pouco de seu próprio “ego”; isto é, deixa transparecer, embora sem o desejar, resquícios interiores.
Tal assertiva é tambem confirmada em parte, pela psicanálise. Assim deduz-se de que quem escreve poesias é irretorquivelmente dotado de u’a alma cândida, por vezes boêmia; quem é suave nos escritos demonstra sensatês, gestos comedidos; quem escreve de maneira violenta, denota um espírito combativo por vêzes, revoltado em outras ocasiões; e assim por diante.
Isso nos ocorreu, ao presenciarmos a série de legendas usuais nos para-chóques e trazeiras de caminhões de transporte, algumas curiosas, outras insossas, humorísticas, satiricas, de fé, etc., etc.
Uma “jardineira”, tipo antigo, cuja carcaça se encontra “pedindo a Deus para que o mundo acabe em açúcar para éla morrer doce”, ostenta, num vermelho visível, a seguinte inscrição: “Hoje estou velha, mas já fui muito boa”. É o realismo aliado à situação, refletindo, sem dúvida, o conformismo de seu motorista.
“Sái da frente” – traduz arrogancia, petulância, sem sombra de dúvidas.
“O Joãozinho chegou” – deve significar convencimento.
“Bateu? Azar seu” – é uma inscrição que traduz indiferença.
“Vou com Deus” – atesta que o homem do volante alimenta fé.
“O mundo gira e o Ford róda” – Prestígio pela marca do veiculo, propaganda diréta de sua qualidade.
“O terror das estradas” – deve representar convencimento de forças, experiência.
“Carona, só de saia” – significa que o homem é francamente das mulheres. Só que o mesmo olvidou-se que soldado escocês tambem usa saiote.
“Cuidado, que eu peso muito” – conhecimento de potência, um aviso de alerta.
“Não vou na conversa” – Quer dizer sagacidade, pretensão, auto-confiança.
São inúmeras as legendas existentes nos caminhões de transportes. O uso passou a ser normal. Raramente vê-se um veículo dessa qualidade que não ostente sua inscrição. O espírito, a “verve”(,) a crença, a confiança, humorismo, seriedade, pretensão, são os principais motivos déssas legendas.
Cada qual procura delinear seu melhor pensamento, pensamento que, de conformidade com o normal, representa um pouquinho de espírito interior de seu idealizador.
Coisas curiosas, por vezes bonita, outras vezes até estúpidas. De qualquer maneira, pensamos, significam alguma coisa de útil. Representam a exteriorização de pensamentos, atraem a curiosidad(e), provocam risos ou simpatias, servem de comentários.
Uma vez que a vida está tão difícil mesmo, nada melhor do que certas coisinhas, aparentemente insignificantes, para contribuir de qualquer módo para despertar atenções públicas ou ocupar pensamentos, por instantes que sejam. O brasileiro costuma levar a “vida flauteada”, o que é uma grande coisa, uma grande qualidade.
Os letreiros citados tornaram-se, hoje, necessários. Costume que vai se tornando tradição.
Um misto de coisas, idéias, pensamentos e desejos, existem nessas legendas. Além das utilidades citadas, descobrimos nós outro valor nessas inscrições: deram-nos motivo para a crônica de hoje.
Extraído do Correio de Marília de 29 de janeiro de 1958
Tal assertiva é tambem confirmada em parte, pela psicanálise. Assim deduz-se de que quem escreve poesias é irretorquivelmente dotado de u’a alma cândida, por vezes boêmia; quem é suave nos escritos demonstra sensatês, gestos comedidos; quem escreve de maneira violenta, denota um espírito combativo por vêzes, revoltado em outras ocasiões; e assim por diante.
Isso nos ocorreu, ao presenciarmos a série de legendas usuais nos para-chóques e trazeiras de caminhões de transporte, algumas curiosas, outras insossas, humorísticas, satiricas, de fé, etc., etc.
Uma “jardineira”, tipo antigo, cuja carcaça se encontra “pedindo a Deus para que o mundo acabe em açúcar para éla morrer doce”, ostenta, num vermelho visível, a seguinte inscrição: “Hoje estou velha, mas já fui muito boa”. É o realismo aliado à situação, refletindo, sem dúvida, o conformismo de seu motorista.
“Sái da frente” – traduz arrogancia, petulância, sem sombra de dúvidas.
“O Joãozinho chegou” – deve significar convencimento.
“Bateu? Azar seu” – é uma inscrição que traduz indiferença.
“Vou com Deus” – atesta que o homem do volante alimenta fé.
“O mundo gira e o Ford róda” – Prestígio pela marca do veiculo, propaganda diréta de sua qualidade.
“O terror das estradas” – deve representar convencimento de forças, experiência.
“Carona, só de saia” – significa que o homem é francamente das mulheres. Só que o mesmo olvidou-se que soldado escocês tambem usa saiote.
“Cuidado, que eu peso muito” – conhecimento de potência, um aviso de alerta.
“Não vou na conversa” – Quer dizer sagacidade, pretensão, auto-confiança.
São inúmeras as legendas existentes nos caminhões de transportes. O uso passou a ser normal. Raramente vê-se um veículo dessa qualidade que não ostente sua inscrição. O espírito, a “verve”(,) a crença, a confiança, humorismo, seriedade, pretensão, são os principais motivos déssas legendas.
Cada qual procura delinear seu melhor pensamento, pensamento que, de conformidade com o normal, representa um pouquinho de espírito interior de seu idealizador.
Coisas curiosas, por vezes bonita, outras vezes até estúpidas. De qualquer maneira, pensamos, significam alguma coisa de útil. Representam a exteriorização de pensamentos, atraem a curiosidad(e), provocam risos ou simpatias, servem de comentários.
Uma vez que a vida está tão difícil mesmo, nada melhor do que certas coisinhas, aparentemente insignificantes, para contribuir de qualquer módo para despertar atenções públicas ou ocupar pensamentos, por instantes que sejam. O brasileiro costuma levar a “vida flauteada”, o que é uma grande coisa, uma grande qualidade.
Os letreiros citados tornaram-se, hoje, necessários. Costume que vai se tornando tradição.
Um misto de coisas, idéias, pensamentos e desejos, existem nessas legendas. Além das utilidades citadas, descobrimos nós outro valor nessas inscrições: deram-nos motivo para a crônica de hoje.
Extraído do Correio de Marília de 29 de janeiro de 1958
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