“De pleno acôrdo” (2 de agosto de 1957)

Em virtude da correlação existente entre uma série de artigos que ultimamente vimos publicando, e, atendendo ainda ao que nos foi solicitado por um leitor e amigo, transcrevemos, a seguir, do “Diário de Notícias”, de Ribeirão Preto, o artigo cujo título é o deste epigrafe, da lavra de Dom Luís Mousinho, Bispo de Ribeirão Preto. Eis a íntegra do referido trabalho:

“Anteontem recebiamos extensa mensagem telegráfica do Ministro Rocha Lagoa, Presidente do Superior Tribunal Superior Eleitoral, solicitando nossa intervenção junto aos Sacerdotes e Religiosos no sentido de os mesmo se empenharem num intenso trabalho de encaminhado do povo para o alistamento eleitoral. Entre outras considerações, assim nos falava o Ministro: “Venho respeitosamente sugerir a Vossa Excelência determine às Autoridades eclesiásticas sob sua jurisdição que em tôdas as oportunidades que se lhes apresentem de contacto com os fiéis, sejam os mesmo esclarecidos sôbre a necessidade do cumprimento daquele dever cívico e patriótico”.

Estamos em pleno acôrdo. Nem será preciso que façamos esta determinação aos Sacerdotes e Religiosos da nossa Diocese, todos êles plenamente cônscios do papel que lhes incumbe de interpretar o verdadeiro civismo como expressão ou prolongamento da caridade teologal que nos manda amar o próximo como a nós mesmos. Tôda democracia que não tenha alma cristã não passará de mero caricatura. De pura ficção jurídica a serviço dos espertalhões. De estruturação política intrinsecamente falha e por isso corruptível com o tempo.

Todos os Sacerdotes e Religiosos de nossa Diocese estão sentindo que a democracia brasileira, frágil e corroída na sua tessitura íntima, necessita urgentemente da presença e da participação de todos os brasileiros dignos e capazes, quer na elaboração dos seus altos roteiros, quer na engrenagem do seu funcionamento normal. E será pelo voto que êles se desincumbirão dêsse múnus e dessa obrigação. O que mais importa no entanto é que todos se capacitem para VOTAR BEM. Para votar com INTELIGÊNCIA, ou seja, com pleno conhecimento das pessoas e das causas, e com plena LIBERDADE moral. A gravidade da crise que presentemente deturpa a nossa democracia não procede sòmente do reduzido número de eleitores, mas principalmente da má qualidade dos votos. De falta de critério com que muitos eleitores se aproximam das urnas, sejam êles culpados ou não por esta lamentável situação. Enquanto perdurar o voto levianamente prometido ou criminosamente negociado, será inútil esperar melhoria do regime. O voto não é questão de interêsse individual ou partidário, no sentido mesquinho da expressão, nem de amizade pessoal ou gratidão, nem muito menos de capricho ou veneta. É um grande problema de CONSCIÊNCIA, antes mesmo de ser uma questão de amor à Pátria. É um problema de respeito à VERDADE e à JUSTIÇA. Por isso é que êle é tão decisivo para os destinos de qualquer país. Na medida em que for se apagando em cada eleitor o sentido da justiça e da verdade, nesta mesma proporção irá êle contribuindo para a corrupção ou falência total do regime democrático.

Estamos convictos da excepcional gravidade do momento que atravessamos. Só os ingênuos não a sentem. Aumenta cada dia na alma sofredora do povo um fermento de desencanto, de decepção, de desespero e de reação contra a nossa malsinada democracia, reconhecidamente conduzida por chefetes e por grupos que não colimam as legitimas aspirações da nação. Alguns dos nossos Partidos Políticos não passam de autênticas escolas de ilusionistas ou de hipnotizadores do povo. Daí o receio de estarmos marchando para uma eclosão de consequências imprevisíveis. Antes que tal aconteça, façamos a revolução espiritual da consciência cívica em busca da justiça e da verdade. A revolução pela qual cada eleitor faça do amor ao Brasil uma expressão do seu amor a Deus.”

Extraído do Correio de Marília de 2 de agosto de 1957

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