Marília e o gosto artístico (20 de junho de 1957)

De há muito, notamos em nossa cidade, pouca preocupação ou pouco gosto pelas artes lírico-musicais; pouco apoio, pouca simpatia, especialmente pela chamada “música fina”. Confessamos que em matéria musical, por exemplo, não somos apenas leigos; somos completamente cegos. Acontece, que, em decorrência de nossas obrigações de órgão informativo, temos comparecido aos poucos concertos de importância que aqui têm sido realizados.

A julgar pelos valores que vez por outra se exibem em nossa cidade, e, por outro lado, considerando o número relativamente pequeno do público que habitualmente frequenta audições desse jaez, ficamos convencidos do que acima afirmamos.

Não queremos dizer com isto, que um artista de renome ao apresentar-se ao público mariliense, o faça sòmente “às paredes”; sempre existe um pequeno número de apreciadores do gênero, número êsse que ao contrário de bem representar o gosto artístico dos marilienses, traduz sem dúvida, a indiferença da maioria.

A música fina, executada por autoridades na questão, ouvida com paciência e silêncio, faz bem ao espírito, tornando-se um lenitivo, tornando-se um lenitivo mental. A maioria dos marilienses ignora o fato.

Essa nossa observação data de há muitos anos. Muita gente deve ter percebido êsse fenômeno, com tôda a certeza, inclusive o Tenis Clube, a União dos Treze e a Luso-Brasileira. Confessava-nos certa ocasião, uma consagrada pianista, que tôdas vezes que se exibia em Marília, ficava decepcionada com a pequena assistência. E ia mais além, dizendo que outros artistas, tiveram de nossa cidade, ao aqui apresentarem-se, a mesma opinião.

A música popular e a música sertaneja estão invadindo a cidade e cantores dêsse gênero, entre nós fazem excelentes negócios, auferindo bons lucros. Acontece que nem todos os representantes da boa música sertaneja aqui se apresentam; até verdadeiros “vigaristas” ludibriam o gosto dos marilienses.

Terça-feira à noite as senhoritas Maria Tomoko Nishi e Lúcia Tetsuko Nishi, alunas do sétimo ano do curso de piano (classe do prof. Mário de Souza), do Conservatório Musical “Santa Cecília”, apresentaram um magnífico recital no palco-auditório da Rádio Dirceu. Foi uma audição de músicas selecionadas, dos mais famosos autores internacionais, executada com maestria e agrado ímpares. O aludido estabelecimento artístico distribuira com antecipação, mais de 250 convites-familiares, inclusive a tôdas as autoridades do município, tendo comparecido apenas um suplente de vereador e mais umas vinte pessoas.

O recital foi indiscutivelmente completo e agradabilíssimo, pois as moças souberam desincumbir-se a inteiro contento da apresentação, que agradou em cheio. A assistência local, propriamente dita, foi algo decepcionante, em comparação à beleza do concerto, esplendidamente selecionado e maravilhosamente executado.

O prof. Mário de Souza referia-se ao fato, algo aborrecido com a indiferença pública, para manifestar o mesmo ponto de vista por nós ora externado. E êle tem razões. Se em lugar de um recital de músicas finas, o Conservatório referido (ou outra entidade qualquer) patrocinasse uma audição sertaneja, não haveria necessidade de convites especiais; poderiam ser cobrados os ingressos e a lotação excederia à expectativa... Quer duvidar, dirija-se aos auditórios das três emissôras locais, por ocasião das apresentações dos programas caipiras...

Extraído do Correio de Marília de 20 de junho de 1957

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