O desarmamento universal (30 de maio de 1957)

Publicou há dias a imprensa paulistana, um telegrama procedente de Washington, acerca do desarmamento universal, partindo inicialmente pelos Estados Unidos e Moscou.

Limos com bastante ceticismo o teôr do aludido despacho e no momento passou-nos pela mente aquela anedota do velho cabelo que chamou a filha “às falas”, quando percebeu que a moça, já bem formada, alimentava idéias de casamento. Dissera-lhe então o pai: “Minha fia, vancê já tá na idade de casá. Vancê deve sabê qui seu pai é home bão i num vai impedi seu casamento cum ninguém. Vancê pode casá cum quem quisé, desde qui seja cum u Belarmino, fio du cumpadre Bastião”...

Moscou e USA, armados até os dentes, aperfeiçoando dia a dia os mais terríveis engenhos de guerra, vez por outra externam planos de desarmamento universal, um defendendo o fato para diminuir a tensão do mundo, outro lutando “pela paz”.

Como dois garotinhos que pretende “varar” o circo, tendo medo de serem apanhados pelo “guarda do lado de dentro”, um fica convencendo ao outro que aquêle deve ser o primeiro. Andrei Gromiko, ministro das relações exteriores da Rússia, apresentou ao Presidente Eisenhower uma proposta “sui generis”: Que os Estados Unidos dessem o primeiro passou e aceitassem a inspeção soviética a respeito, na base de quilômetro por quilômetro. Ike “pulou na parede” ante a proposta, como não poderia deixar de ser, rechaçando a idéia “pró paz” defendida, nessas condições, pelo intempestivo Gromiko. E lançou a contra-proposta americana, invertendo os papéis. Quem “afinou” desta vez, fugindo à parada, foram os vermelhos.

Já confessamos repetidas vezes, que nada entendemos de política, especialmente a universal, no sentido como a mesma vem sendo praticada. Mas nem por isso, deixamos de tirar nossas conclusões, quando conhecemos alguns pormenores relacionados com tais manobras. Foi por isso que ficamos verdadeiramente admirados e incrédulos, quanto às possibilidades dêsse acôrdo bi-lareral de desarmamento russo-americano.

Entendemos que não será possível, porque a desconfiança é tão grande entre as duas nações e porque a situação, conforme se encontra, não se casa com a idéia. Quem garantirá aos Estados Unidos que a Rússia procederá em definitivo o seu desarmamento, respeitando fielmente as clausulas e condições do possível tratado nesse sentido? Por outro lado, quais as garantias que os EE. UU. oferecerão aos russos, caso êstes viessem “a atirar a primeira pedra”?

Para sermos franco, achamos não só inviável, como até infantil a idéia do desarmamento universal, começando por essas duas nações. E se a medida puder vir a ser efetivada, como é o desejo da maioria dos povos, que vivem angustiados sob a tensão de nova e perigosa guerra mundial, não creremos na sinceridade do acontecimento, que, de uma ou outra maneira, visa demonstrar falta e futuramente, que o acordo não fôra cumprido. Não acreditamos que nenhum dêsses dois países, do jeito que caminham as coisas atualmente, possam confiar entre si, a ponto de um ser o primeiro a desarmar-se para dar o exemplo. E, se isto acontecer, mesmo assim não creremos; haverá “gato na tuba”, inegavelmente.

Extraído do Correio de Marília de 30 de maio de 1957

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