Retrato desolador do Brasil (19 de junho de 1956)

Tantas são as deficiências econômico-administrativas do país, que só um estudioso apaixonado e grande especialista na matéria poderia enumera-las.

Além do malfadado aumento do custo de vida, em consequência dos “balões de ensaio” do novo nível de salário mínimo, eis que atualmente, “dona” COFAP importa banha dos Estados Unidos, enquanto um milhão de porcos aguarda o abate no sul do país. Motivo? Falta de transporte.

O diretor da Viação Férrea do Rio Grande do Sul, Sr. Francisco Lima, esteve recentemente no Rio de Janeiro, avistando-se com o Sr. Presidente da República. Foi solicitar licença para importar sal da Espanha, a fim de evitar que grande quantidade de charque venha a deteriorar-se. Isto, porque o sal importado da Espanha chega ao estado sulino mais depressa do que o procedente do Estado do Rio Grande do Norte!

O Sr. Francisco Lima em entrevista a um jornal do Rio, fez aterradoras, porém verdadeiras revelações a respeito da malfadada COFAP, considerando-a um organismo completamente inútil. Afirmou mais que se o Govêrno providenciasse o transporte dos gêneros alimentícios, bem como seu escoamento das fontes, a vida poderia baixar 50 por cento, sem intervenção da COFAP.

O que vale, fomentar o plantío ou financiar a produção do trigo? A safra do último ano, num montante de 186 mil toneladas, está empilhada nas cidades de Santa Rosa e Carazinho, até no interior de igrejas (por falta de armazéns próprios).

Afirmou o Sr. Francisco Lima: “Quem quiser ver o trigo, poderá vê-lo passeando nas ruas de Porto Alegre. A formiga póde ser vista carregando os grãos, mas os carunchos da côr do trigo, são imperceptíveis, levando os grãos nas costas”.

E foram sinceras, cremos, as declarações do Sr. Francisco Lima. Disse mais que o Estado gaucho produz muitos gêneros alimentícios, que permanecem sem exportação, por falta de transporte, em prejuizo do Rio Grande do Sul e em detrimento aos próprios interesses nacionais, como é o caso da banha, óra importada dos Estados Unidos, enquanto um milhão de suinos aguarda a hora do sacrifício. E ninguém se atreve a mata-los, com medo de prejuisos, eis que não existem meios suficientes de transportes.

Óra, transporte, foi um dos angulos do trinômio batido pelo Sr. Juscelino Kubitschek em sua campanha eleitoral. Até agora, parece-nos que pouco ou nada foi feito. E em se tratando de um assunto que não é tão complexo assim e que não demanda tambem tempo dilatadissimo, estranhamos a atuação do Govêrno nesse particular.

Em verdade, as declarações do Sr. Francisco Lima, foram as de um grande pintor: executou, com sinceridade, um retrato desolador do Brasil.

Extraído do Correio de Marília de 19 de junho de 1956

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